A imagem de satélite abaixo revela, de forma impressionante, a degradação da cobertura florestal no estado de Rondônia, na Amazônia Legal brasileira. O padrão geométrico de clareiras na floresta evidencia uma ocupação humana agressiva, marcada por desmatamento sistemático, sobretudo para a expansão da agropecuária e pela presença de infraestruturas viárias, como a BR-364. Trata-se de um processo que vem se intensificando desde os anos 1970 e que compromete um dos biomas mais ricos e importantes do planeta: a Floresta Amazônica.
1. Contexto histórico: da floresta à fronteira agrícola
A ocupação de Rondônia foi incentivada por políticas governamentais do regime militar brasileiro, sobretudo nos programas de integração nacional e reforma agrária:
- Décadas de 1970 e 1980: O governo federal implementou projetos de colonização promovendo a migração de famílias do Sul, Sudeste e Nordeste. O lema "integrar para não entregar" impulsionou a abertura de estradas como a BR-364, que se tornou eixo principal da devastação.
- INCRA e assentamentos rurais: Milhares de lotes foram distribuídos sem planejamento ambiental adequado, o que levou à derrubada de vastas áreas de floresta para o plantio e criação de gado.
- Madeireiras e garimpos: A exploração econômica inicial da região envolveu intensa atividade madeireira e, posteriormente, garimpos ilegais de ouro e cassiterita.
2. Padrão de desmatamento: a “espinha de peixe”
O padrão visível na imagem é conhecido como "espinha de peixe" ou "radial":
- Surgem a partir de uma estrada principal (geralmente federal ou estadual).
- Pequenas estradas vicinais são abertas perpendicularmente.
- Lotes agrícolas são desmatados em forma retangular, seguindo a lógica do parcelamento fundiário.
- Com o tempo, esses lotes se expandem e se unem, formando grandes mosaicos de desflorestamento.
Esse tipo de padrão é típico de ocupações dirigidas ou espontâneas, com baixa fiscalização ambiental.
3. Dados atualizados do desmatamento em Rondônia
- Segundo o PRODES/INPE, Rondônia perdeu mais de 50 mil km² de floresta amazônica desde 1988 – uma área maior que a da Dinamarca.
- Em 2022, Rondônia foi o quarto estado que mais desmatou na Amazônia, atrás apenas do Pará, Mato Grosso e Amazonas.
- Em 2023, houve crescimento de 17% no desmatamento em algumas áreas do sul do estado, especialmente próximas a unidades de conservação e terras indígenas.
- A maior parte da área desmatada é convertida em pastagens degradadas, que perdem produtividade em poucos anos e impulsionam mais desmatamento (efeito dominó).
4. Causas principais do desmatamento
a) Pecuária extensiva
Responsável por cerca de 80% do uso do solo desmatado.
Rondônia tem um dos maiores rebanhos bovinos do Brasil: mais de 14 milhões de cabeças de gado.
Em geral, são pastos de baixa produtividade, exigindo grandes extensões de terra.
b) Agricultura
Expansão de soja e milho em regiões como Vilhena, Chupinguaia e Colorado do Oeste.
Avanço da agricultura mecanizada substituindo áreas antes usadas para gado.
Monoculturas com alto uso de agrotóxicos e pressão sobre áreas de floresta.
c) Madeira ilegal
Extração clandestina de espécies valiosas como mogno, ipê e jatobá.
Rondônia já teve centenas de serrarias ativas sem licença ou com fraudes em planos de manejo.
Muitas vezes, o desmatamento se inicia com a retirada seletiva de madeira (fase chamada de “degradação florestal”).
d) Grilagem de terras
Falsificação de documentos e ocupação ilegal de terras públicas.
Áreas protegidas, como unidades de conservação e terras indígenas, são invadidas e loteadas.
A grilagem é um dos principais motores do desmatamento em áreas onde a floresta deveria estar intacta.
5. Consequências ambientais
a) Perda de biodiversidade
A floresta amazônica de Rondônia abriga milhares de espécies de plantas, insetos, aves e mamíferos – muitas delas endêmicas e ameaçadas.
O desmatamento fragmenta habitats, impede migração de espécies e reduz populações viáveis.
b) Alteração do ciclo da água
Árvores amazônicas transpiram bilhões de litros de água para a atmosfera todos os dias.
O desmatamento reduz a formação de rios voadores, afetando as chuvas em outras regiões do Brasil, como o Sudeste e o Centro-Oeste.
Com menos cobertura florestal, há maior erosão, assoreamento de rios e seca de nascentes.
c) Emissões de carbono
O Brasil é um dos maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo, principalmente devido ao desmatamento.
Cada hectare de floresta amazônica derrubado pode liberar entre 100 e 200 toneladas de CO₂ na atmosfera.
d) Aumento de queimadas
Áreas recém-desmatadas são geralmente queimadas para limpar o solo.
As queimadas geram fumos tóxicos, afetam a saúde da população local e aumentam as emissões de poluentes atmosféricos.
Rondônia é um dos estados com maior número de focos de calor detectados por satélites do INPE.
6. Consequências sociais e culturais
Violência no campo: Conflitos armados entre grileiros, madeireiros, fazendeiros e comunidades indígenas ou tradicionais são frequentes.
Perda de direitos indígenas: Povos como os Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau e Kawahiva têm suas terras invadidas, caçadas e contaminadas por atividades ilegais.
Impactos à saúde: Queimadas e uso de agrotóxicos afetam populações vulneráveis com doenças respiratórias e contaminação da água e do solo.
Desestruturação social: A ocupação desordenada e a degradação ambiental dificultam a oferta de serviços públicos e incentivam o êxodo rural.
7. Áreas protegidas sob ameaça
Na imagem, destacam-se várias terras indígenas e unidades de conservação pressionadas pelo avanço do desmatamento: TI Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau, Massaco, Sete de Setembro, Zoró e Parque do Aripuanã.
Muitas dessas áreas aparecem como manchas verdes contínuas cercadas por desmatamento, o que compromete sua integridade ecológica.
A restrição de uso dos Piripkura indica que se trata de uma área habitada por povos indígenas isolados, cuja sobrevivência depende diretamente da preservação da floresta.
8. Soluções e caminhos possíveis
Fortalecimento da fiscalização ambiental, com apoio de tecnologia (satélites, drones, radares) e aumento de operações presenciais.
Demarcação e proteção efetiva de terras indígenas, com combate à grilagem e incentivo à vigilância comunitária.
Promoção de cadeias produtivas sustentáveis, como manejo florestal legal, produção de castanha, borracha e óleos vegetais.
Reflorestamento e recuperação de áreas degradadas, especialmente em nascentes e áreas de preservação permanente (APPs).
Educação ambiental e apoio a práticas agroecológicas, integrando conservação da natureza com produção alimentar de baixo impacto.
Conclusão
A imagem de Rondônia é um retrato dramático, mas realista, de uma das frentes mais críticas do desmatamento amazônico. O avanço da fronteira agrícola, alimentado por políticas mal planejadas e pela exploração predatória, compromete não apenas a integridade da floresta, mas também o equilíbrio climático do país e do planeta. Reverter esse cenário exige vontade política, engajamento social e valorização da Amazônia viva e em pé como ativo estratégico para o Brasil e para o mundo.
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