Hoje, milhares de estudantes do ensino médio passam horas consumindo vídeos curtos no Instagram, TikTok e YouTube sobre ciência ou suposta ciência. Aulas estão sendo inundadas e atrapalhadas com perguntas fora de hora sobre "o vídeo que vi no Tik Tok". Muitos acreditam que estão "aproveitando o tempo" e aprendendo mais, pois o conteúdo parece impressionante: física quântica, dobras do espaço-tempo, espécies raríssimas, doenças exóticas e fenômenos astronômicos que sequer aparecem no currículo escolar. No entanto, é preciso questionar seriamente: Isso está realmente ajudando no seu desenvolvimento intelectual ou apenas preenchendo a mente com curiosidades soltas? Está realmente na hora de você aprofundar nesses conhecimentos? Você não está apenas ajudando um algoritmo a reforçar a divulgação de informações com o objetivo de caça-likes?
1. Uma sensação falsa de aprendizado
Um dos maiores riscos desses vídeos é gerar
a ilusão de conhecimento. O aluno sente que está avançado porque viu algo
complexo. Ele acha que entende porque um divulgador (às vezes até bem intencionado) simplificou o tema com
analogias bonitas. Porém, na prática, ele ainda não domina temas muito mais
básicos, como fotossíntese e funcionamento do DNA, regra de três composta, funções matemáticas, conceitos elementares de
química ou a classificação dos animais e das plantas. Ou seja, o aluno pode estar substituindo temas que realmente precisa se dedicar, reforçar, praticar e dominar... por outros que simplesmente foram enfeitados para atrair sua atenção.
2. Inversão de prioridades e foco
Ser bombardeado diariamente com conteúdos
de física quântica, doenças raríssimas ou animais de regiões isoladas da Terra
dá uma sensação enganosa de progresso intelectual. Mas isso pode desviar
completamente o foco daquilo que realmente importa naquela fase escolar: o
domínio sólido dos conceitos fundamentais que serão a base para qualquer
conhecimento científico futuro.
3. Sobrecarga cognitiva e poluição
mental
Essas curiosidades chegam sem contexto, sem
sequência didática e sem conexão entre si. O resultado: informações aleatórias
se acumulam na memória de trabalho do estudante, gerando confusão, saturação e
até ansiedade. O cérebro gasta energia com aquilo que não faz parte da
construção lógica do aprendizado, poluindo o processo de formação intelectual.
4. Comparação injusta: o conteúdo relevante da sala de aula parece chato
Quando o aluno se acostuma com vídeos
extremamente estimulantes, coloridos e rápidos, o conteúdo das aulas parece
mais lento e "chato". Isso acaba diminuindo a motivação para estudar
aquilo que realmente vai desenvolvê-lo e que ele precisa dominar para provas,
vestibulares e para entender o mundo de forma crítica. Ou para, quando realmente for necessário, aprofundar-se nesses temas complexos no mundo acadêmico, pautado em livros, programas de estudo, modelos matemáticos etc.
5. Um exemplo claro: física quântica no
ensino médio
A maioria dos fenômenos da física quântica
exige matemática avançada (cálculo diferencial, matrizes, funções probabilísticas etc.). Explicações
superficiais em vídeos de 30 segundos podem gerar mais confusão do que
aprendizado real. Além disso, o fato de o aluno achar que “entendeu” algo tão
complexo pode gerar um bloqueio inconsciente para estudar aquilo que ele julga
básico demais.
6. Consequências práticas observadas
7. Um contraponto necessário
Nem todo conteúdo de redes sociais é ruim.
Há divulgadores sérios que motivam o interesse dos jovens de forma excelente.
Quando o conteúdo é contextualizado, guiado por um professor ou usado como
complemento, pode ser inspirador. O problema é quando esse tipo de conteúdo
começa a substituir o estudo estruturado ou consumir tempo precioso de estudo
consciente. O aluno deve se policiar para não substituir o conteúdo necessário ao seu aprendizado em formação por uma coletânea de informações desconectadas.
8. Conclusão: fascínio não é
conhecimento
É preciso compreender que curiosidades
científicas não substituem conhecimento científico real. Estudos em
neurociência educacional, como os de Daniel Willingham (2010), mostram que
aprendizado duradouro depende de repetição, esforço intencional e organização
lógica do conteúdo — exatamente o oposto de consumir pílulas aleatórias de
curiosidades.
Pesquisas sobre efeito de ilusão de
profundidade demonstram que estudantes que assistem vídeos com linguagem
sofisticada têm a falsa impressão de domínio, mas não conseguem aplicar o
conteúdo em situações práticas. Esse fenômeno foi observado por Rozenblit &
Keil (2002) no chamado efeito da ilusão de explicação, em que as pessoas
acreditam que entendem conceitos complexos, mas falham ao tentar explicá-los
com precisão (precisão, aliás, que até com anos de estudo acadêmico pode ser difícil).
Portanto, aprender exige esforço contínuo,
organização e, muitas vezes, enfrentar conteúdos que não têm tanta dopamina
imediata. O verdadeiro estudante é aquele que separa o momento de
entretenimento do momento de estudo e não confunde fascínio com progresso. Que não deixa de lado as informações organizadas do ambiente e programa escolar para montar em sua cabeça uma "enciclopédia aleatória de conhecimentos fragmentados". Que confia na condução dos seus professores para atingir um objetivo que está logo à sua frente.
A pergunta que fica é: será que você está realmente aprendendo, ou está apenas
acumulando curiosidades brilhantes que te afastam do conhecimento verdadeiro?
Pensar nisso pode ser um passo importante para recuperar a autonomia do seu
aprendizado e retomar o controle do que realmente importa para o seu
crescimento acadêmico e intelectual.
Excelente abordagem sobre a superficialidade de conhecimento que esse bombardeamento midiático a que estamos expostos tem promovido. Parabéns!
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