A Audiência Pública sobre o Parque Estadual da Serra de Santa Helena pecou pela não apresentação do projeto e de suas prováveis delimitações. Alguns dos presentes (e acho que não eram poucos) mal sabiam do projeto e do alcance em termos de área ou mesmo do local onde poderia ser posicionado (alguns tiveram a impressão que o Parque Estadual era o Boulevard Santa Helena). Outro pecado foi a não explanação inicial sobre a diferença de APA e de Parque Estadual, que já expliquei
AQUI no
blog. Na verdade, senti que o deputado André Quintão (autor do projeto) estava um pouco acanhado ou constrangido com a condição que havia sido montada para a audiência pública. Instituída a mesa dos trabalhos, percebi que o tema central da audiência logo passaria para o segundo plano, infelizmente.
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Deputado Duílio de Castro, deputado André Quintão (autor do projeto do Parque Estadual da Serra de Santa Helena), deputado Célio Moreira (presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa) e vereador Antônio Rogério (presidente da Câmara Municipal). |
A Audiência Pública foi definitivamente prejudicada pela introdução ampla, com direito a apresentação (pobre por sinal) do projeto do Boulevard Santa Helena (presença na mesa e no microfone para manifestações da população). Na verdade, os empreendedores não têm muito o que mostrar pois tudo o que pensam para a área está (espero) na dependência do que virá dos estudos que estão sendo feitos, em especial (para eles) do estudo geotécnico e hidrogeológico da área. Os impactos sobre os animais (em especial a avifauna que nidifica nos paredões rochosos parece ser coisa fácil de resolver - através da extinção ou expulsão das espécies, provavelmente). O corte de enorme área de cerradão para instalar um bloco inteiro de lotes (lembrada pelo Walter Matrangolo) parece ser apenas uma banalidade. As áreas alagáveis estão longe de merecer a atenção dispensada no artigo 2o do Código Florestal, que "mesmo intermitentes" devem ser tratadas como áreas de preservação permanente. Foram usados os mesmos
slides da audiência pública sobre o boulevard , porém de forma muito mais desorganizada. Até o slide com a cachoeira do Véu da Noiva, da Serra do Cipó, ainda estava lá no meio (como se fosse a paisagem da Serra de Santa Helena). Achei engraçado que tenham classificado a audiência pública do boulevard como sendo um evento "de cunho político". Engraçado, não entendi. Acho que evento de cunho político foi o que fizeram ali, naquele momento, mas deixa essa discussão para lá.
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A cachoeira Véu da Noiva (Serra do Cipó) continua fazendo parte da apresentação do bulevarsantahelena. Clique AQUI. |
A participação popular iniciou-se com as pessoas que se inscreveram, sem o menor conhecimento do projeto do Parque Estadual, para falar sobre a importância do
"progresso" representado pelo Boulevard Santa Helena. Uma defesa desconexa, feita por pessoas que gosto e prezo muito, mas que pecaram por desconhecer a amplitude da questão ambiental. Estão amplamente perdoados, sei que estão eivados de boas intenções e preocupados com o abandono da área da fazenda (abaixo da perimetral). Interessante que, em momento algum, lembraram que o abandono é por parte dos próprios proprietários que deveriam ser responsáveis por cercar e limpar a área (a prefeitura não pode fazer limpeza de terrenos particulares). A citação de que ainda há peixinhos na Lagoa da Chácara e que a água naquela região surge a 98 centímetros na parte mais baixa e 1,90 metros na parte mais alta mostra que não estamos errados em questionar a construção de prédios por ali (de até 10 pavimentos como sugere o RIMA - veja abaixo - ou de quatro pavimentos como dizem agora os empreendedores). Independente da altura, podem afundar do mesmo jeito, prejuízo enorme para quem adquirir uma dessas unidades.
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O projeto continua o mesmo. Quase um ano depois e nada mudou. Clique AQUI. |
Em certa altura das falas populares, as ONGs foram tratadas como "antro de corrupção". Uma pena que não se consiga discernir que há pessoas boas e más, políticos bons e maus e ongs boas e más. Ouvi pedirem acesso às contas da ONG ADESA, basta ir na SEMMA. Creio que tudo está protocolado lá. Poderiam pedir acesso também ao livro da SEMMA com o destino da poda das árvores, que por convênio deveria ir para a ONG ADESA para manutenção da Brigada de Incêndio. Seria interessante olhar o que aconteceu como o referido convênio de março até setembro. #ficadika
Usei a palavra durante a audiência para tecer alguns comentários sobre a Fazenda Arizona e o empreendimento que lá se deseja construir. Pedi tempo igual ao dos empreendedores pois os mesmos usaram o microfone popular (de 3 minutos) e não o tempo que tinham direito na mesa constituída (que ficou, estrategicamente, para o final, para as réplicas-sem-tréplicas). Não era meu objetivo tratar desse assunto e sim da serra no geral, como deixei claro nas minhas primeiras palavras. Contudo, a reunião foi contamidada pelo tema, fazer o quê?. Mostrei, aproveitando o slide da implantação do bulevar, a área de nidificação das aves, a vasta mata existente e as áreas alagáveis próximas à Lagoa da Chácara onde o RIMA sugere edificações multifamiliares de 5 a 10 pavimentos. Em seguida, foi dito pelos empreendedores que faltei com a verdade e que não existe nada sobre prédios de 10 andares para aquela região porque a lei não permite e tal. Bom, o Plano Diretor está sob revisão e pode passar a permitir tudo. E o que falei consta do EIA/RIMA apresentado na audiência pública como o "porte mais indicado" para as tais edificações. Como disseram que eu tenho que ser mais informado, talvez fosse interessante que lessem o próprio RIMA (aquele que tem uns momentos CTRL-C/CTRL-V citando Lagoa Santa onde deveria ser Sete Lagoas). O trecho, constante da página 15 do Relatório de Estudos Geológicos, encontra-se a seguir:
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Clique na imagem para ampliar. |
Lembro que os empreendores do boulevard tiveram assento à mesa e direito
à palavra em dobro por essa razão, inclusive direito à "palavra final".
Não entendi. Era audiência pública e virou evento de marketing em momento e local inadequados, com público majoritariamente contrário ao empreendimento por conhecer mais profundamente sobre o tema.
No final da audiência o tema virou para a necessidade de regulamentação da APA Santa Helena, ponto que abordei em minha fala "estivesse a APA regulamentada e não estaríamos aqui reunidos, inclusive os empreendedores saberiam os limites permitidos para construção e provavelmente já estariam em obras nas regiões edificáveis". O pessoal da SEMMA (Secretaria Municipal de Meio Ambiente) justificou o atraso pela falta de funcionários (apenas 35 para olhar a cidade inteira). Dessa maneira, a SEMMA insiste em não assumir a culpa pela não-regulamentação. Mas considero que há culpa sim. A SEMMA deveria lutar, colocar a boca no trombone, pela abertura de concurso e contratação de mais pessoas para trabalhar esse tema e outros. Já aviso que não estou disponível, não quero emprego público e nem tenho ninguém a indicar. A falta de estrutura na SEMMA é fruto do desinteresse político de resolver essas questões. Aliás, senti falta do Cláudio Busu na reunião. Mas também senti falta do prefeito e de 10 vereadores (só foram o Claudinei, o Dalton e o Antônio Rogério). Interessante também que o presidente da Seltur estava presente e nem foi convidado para compor a mesa, retirando-se logo após o início da sessão.
Após a audiência conversei um pouco com o engenheiro Guilherme Rios da Starta Empreendimentos, responsável pela apresentação do projeto do boulevard, com o advogado dos donos da Fazenda Arizona e com o Flávio, proprietário da Fazenda. O Flávio, não preciso dizer é pessoa sempre muito gentil e disposta a conversar. Esclareci a ele que toda a minha discussão em relação ao bulevar é fruto da minha preocupação com a área no sentido da preservação ambiental (vegetação, fauna, áreas de recarga...) e de procurar informações sobre a segurança da construção nas áreas pretendidas (em especial dos prédios). Não sei se o Flávio realmente compreende minha preocupação já que de uma forma simplista vi (e intervi) em sua fala sobre quem é a "favor do progresso" e "contra o progresso" e que o projeto do bulevar precisa ser levado "à maioria silenciosa que apóia o progresso". Flávio, fico triste, mas entendo você. É um pouco difícil mesmo perceber que o que você pensa intimamente que são seus "inimigos" estejam verdadeiramente preocupados com a questão da área e não em busca de vantagens ou outros interesses. Mas por favor, não me chame - como terceiros comentaram - a trabalhar no projeto do bulevar. Acho que o que eu tinha para falar sobre o mesmo já está se encerrando e pode amplamente ser lido aqui no blog. Minha função é de alertar sobre o tema. Não quero no futuro ser visto como o "biólogo que sabia do problema e não falou nada", como tantas pessoas estão fazendo. Já tenho minha consciência traquila. Oro a Deus para que também dê a todos os interessados na construção do bulevar a mesma tranquilidade. Só assim as outras questões importante para Sete Lagoas poderão começar a ser discutidas.
Vamos então para a regulamentação da APA de Santa Helena, a regulamentação da APA do Paiol, a regulamentação da APA da Lagoa Grande e ao tratamento dos 95% do esgoto que é lançado no Ribeirão Jequitibá.
Ramon Lamar de Oliveira Junior
PS.: Foi muito bom conhecer o Deputado Célio Moreira, presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa. Já havia assistido algumas outras audiências públicas coordenadas por ele (via TV Assembléia - veja
AQUI) e admiro seu jeitão rigoroso mas acessível na condução do processo.
PS2.: Durante a audiência pública, o eng. Guilherme Rios disse que enviaria os estudos que já estão prontos sobre a arqueologia e a espeleologia da área para os interessados e que, em breve, enviaria também os estudos restantes, bem como a relação dos doutores da UFMG que estão indicados pelo Ministério Público para trabalharem na questão. Ao final da reunião, o engenheiro passou-me o cartão para contato. Escrevi e hoje obtive a seguinte resposta:
Boa tarde Prof. Ramon,
Conforme orientação da EPO Empreendimentos, os estudos de arqueologia,
espeleologia, hidrogeologia, geofísica, geotecnia e biologia que estão em
execução lhe serão encaminhados, bem como o nome de todos os profissionais
envolvidos, tão logo estejam concluídos e protocolados na SUPRAM - Central,
IPHAN e Ministério Público Estadual do Meio Ambiente.
Atenciosamente,
Guilherme Rios.
Ok, continuamos no aguardo. Abraços e obrigado pela atenção.